A leitura deste texto me despertou (ou relembrou) para o fato de que as mudanças no Mundo começam com pequenas mudanças dentro de nós...
Quais são as alavancas para despertar o equilíbrio entre Poder e Amor em uma determinada organização?
Estamos trabalhando para despertar este novo potencial que todos possuímos ou nos mantemos na rotina de criticar a tudo e a todos?
O ‘milagre do nós’ e a nova história que podemos (e devemos) escrever
por Paulo Monteiro
www.nosdacomunicacao.com
Há um pouco mais de um mês visitei a UPP da comunidade carioca Babilônia, acompanhado de amigos e do consultor especialista em transformação social, Adam Kahane, que vinha ao Rio para facilitar uma atividade promovida por alguns colegas e eu, cujo tema era a transformação da nossa cidade.
Quando chegamos à entrada da comunidade, minha primeira surpresa foi ver dois policiais que se aproximavam, muito educados, perguntando a quem procurávamos. Nos levaram até a Associação de Moradores e nos acompanharam durante todo o ‘tour’ promovido pelos líderes locais.
O que vimos (e apreciamos) nesse passeio foi uma comunidade que resgatou sua identidade. Impressionou-nos ver as mulheres que limpavam o centro educativo com tanta alegria e empenho, preparando o local para o reinicio do período escolar. Passamos pela nova praça de convivência, com um campo de futebol novo e com amplas áreas de lazer; visitamos a biblioteca, o centro de informática, e nos deliciamos ouvindo os policiais contando orgulhosos que passaram a ser mediadores sociais que buscam a melhor convivência possível entre os moradores em um espaço agora pacífico.
Quando conversávamos com o vice presidente da Associação de Moradores, Adam lhe perguntou por que havia demorado tanto para que todas aquelas mudanças acontecessem. Nosso interlocutor respondeu que, apesar de haver varias causas e de não existir uma resposta simples, sem dúvida uma das razões era a falta de vontade de alguns grupos de poder. Essa resposta, que não era inédita para nós, propiciou-nos uma intensa conversa no carro durante nossa volta. Explorávamos em nosso diálogo a força da transformação de uma coletividade mobilizada por uma causa e sustentada pela união de diversos agentes de poder.
Adam publicou recentemente um livro chamado ‘Poder e Amor’, no qual expõe a importância do equilíbrio entre essas duas forças, para que transformações positivas possam ocorrer no âmbito social. O livro explica que há duas dimensões do Poder e do Amor. O saudável Poder, sua dimensão positiva, é o ‘poder para’, ou seja, a ação que empodera as pessoas, que permite a realização individual e coletiva, uma ação sublime que leva o ser humano a realizar sua potencialidade e ser tudo o que pode ser. O chamado ‘downside’ do Poder é o ‘poder sobre’, o exercício de uma força arbitraria que busca o beneficio de poucos, privando a muitos de chegarem ao seu desenvolvimento e realização.
Por outro lado, o Amor saudável é aquele que une o que estava separado, é o impulso que nos fortalece como indivíduos e grupos, buscando o que é comum, trazendo a energia da convergência que transcende e inclui as diferenças; é o milagre que realiza a união de ‘eus’ autônomos em um corpo único, o campo surpreendente de um ‘nós’ coeso. Já o ‘downside’ do Amor é o impulso por uma conexão superficial, que busca manter o status quo e ‘ficar bem com todos’ evitando o conflito e, muitas vezes, ignorando o saudável Poder. Muitas vezes esse amor é dogmático e sentimental, e acaba impedindo a autêntica realização de indivíduos e coletividades.
Ao entrar em contato com essa reflexão vi com muita clareza o que vem acontecendo historicamente em nosso país nas mais diversas esferas, sejam estas famílias, escolas, comunidades, cidades etc. Nos falta praticar o equilíbrio entre o Poder e Amor para transformar-nos no que podemos e estamos chamados a ser.
As comunidades periféricas do Rio de Janeiro foram, por anos, vítimas de um poder paralelo que as privou da dignidade de ter uma identidade e propósito. Como se isso não bastasse, membros do chamado ‘poder oficial’ se aproveitavam politicamente dessa situação para perpetuarem-se em seus cargos, mantendo o problema igual ou agravando-o, com uma ação que só beneficiava a uma minoria poderosa.
Em contrapartida, quando prevalece o ‘poder para’ - a ação que busca impulsionar a realização de indivíduos e coletividades - surge uma energia vital de desenvolvimento, de colaboração mutua, de busca do melhor para cada um e para todos. O saudável Poder gera o saudável Amor e ambos os eixos caminham juntos em uma espiral positiva, trazendo uma realidade mais humana e justa para todo o sistema.
Quando essa espiral se desdobra, vemos o milagre de um ‘renascimento’, que foi o que aconteceu no Babilônia e em tantas outras comunidades: a epifania de uma coletividade que tem uma voz e que quer ser ouvida a partir de sua nova realidade. Por isso, há alguns meses, os membros dessa comunidade se reuniram e a rebatizaram como ‘Alto Leme’, uma parte de um famoso bairro do Rio de Janeiro, sepultando de vez a antiga identidade de ser um ‘anexo indesejável’.
O equilíbrio entre Poder e Amor leva a coletividade a compreender de forma prática e experimental que sua vocação e futuro não dependem de uma ‘força externa’, seja esta uma instituição ou um grupo de pessoas ‘poderosas’. A transformação é vista como algo intrínseco ao grupo e como tarefa de cada indivíduo e de todos, que conectados podem operar milagres jamais pensados. Acabamos de ver esse ‘milagre’ no Egito, e presenciamos tantos outros ao longo da história da humanidade. Quando um grupo de pessoas entende visceralmente qual a sua missão e vocação, percebendo seu Poder para a realização de toda sua potencialidade, esse passa a ser o espaço fundamental de transformação que, incluindo o autêntico Amor, provocará novas (e maravilhosas) realidades, até então impensáveis.
Estamos em um momento muito propício da história de nosso país. Depois de tempos em que sopraram vozes retóricas e populistas, surge uma era que naturalmente evoca o saudável Poder a partir das pessoas e comunidades. Temos que aproveitar o momentum que a história nos preparou, e dizer sim à missão de reinventar nossos contextos, sejam estes nossas famílias, empresas, comunidades etc.
O Brasil será outro se entendermos que a verdadeira transformação deve emergir dos indivíduos e coletividades, mesmo que as esferas oficiais de poder não estejam comprometidas com esse salto evolutivo. Um dia essas minorias que exercem o ‘poder sobre’ se verão obrigadas a unir-se à historia que todos decidirão escrever juntos.
A partir da nossa decisão de comprometer-nos com essa nova forma de dialogar e agir, que é a expressão concreta do equilíbrio entre Poder e Amor, construiremos uma nova realidade, um novo País que poderá enfim experimentar os benefícios de realizar-se e evoluir a partir da ação consciente de uma sociedade que terá optado pela doce aventura da autodeterminação.
PAULO MONTEIRO
Paulo Monteiro é mestre em Comunicação e Educação pela Pontifícia Universidad Católica de Chile e pela Universidad Autônoma de Barcelona, bacharel em Filosofia pelo Ateneo Regina Apostolorum de Roma, em sua filial de Nova York – EUA e formado em Comunicação Social pela PUC -Rio. Atua como consultor em Desenvolvimento Humano e Organizacional com foco em áreas como Counseling/Coaching, Carreira, Liderança, Comunicação, Cultura, Desenvolvimento Organizacional e de Equipes. Twitter @pmonteiro88
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